Diário de Tokala - Três não é demais
- Clarinha
- 27 de mar. de 2018
- 4 min de leitura
Quando An'she apareceu no horizonte, Echeyaki já estava acomodado no lombo do meu alce. A viagem teve que ser devagar, primeiro porque eu estava a pé e segundo porque o leão não poderia ficar chacoalhando durante o caminho.
Fomos pela estrada, eu fiquei concentrada em guiar a montaria pelo caminho menos esburacado e irregular possível, por isso confiei em Wohali para nos vigiar do alto do céu. Ele ficava constantemente indo e voltando para alcançar o máximo de quilômetros possíveis e antecipar qualquer perigo.
Chegamos à Encruzilhada no meio da tarde. Estávamos todos exaustos, pela falta de comida, água, e pelo constante estado de alerta. Wohali teve um sono merecido e meu alce se esbaldou no bebedouro próprio para montarias. Já eu, me ocupei em levar Echeyaki para o druida verificar.
"O caso é sério, minha jovem." disse-me o velho tauren druida enquanto examinava as feridas. Olhei preocupada para ele, já com lágrimas nos olhos e perguntei quase num sussurro se ele iria conseguir sobreviver. "Ah sim, o espírito é forte! Esse aqui não vai desistir tão fácil, mas precisará ficar um tempo aqui conosco.".
Apesar da preocupação, meu coração se aliviou e eu soltei um longo suspiro. Afaguei a cabeça do meu leão e disse-lhe para ficar tranquilo, que em breve estaríamos juntos novamente. Agradeci imensamente ao druida e me despedi. Sabia que ficar parada me deixaria ansiosa, então questionei se poderia ser útil para aquele acampamento uma vez mais.
Me avisaram que talvez na Vila Catraca os goblins poderiam estar precisando de auxílio. Então jantei, dormi cedo e no dia seguinte eu estava a caminhando para o sul, em direção ao porto.
De fato, eles estavam mesmo precisando de ajuda e para minha própria segurança, me recuso a escrever o que tive que fazer para aqueles goblins (eles são pequenos, mas me dão certo medo). Essas criaturinhas são bem... como posso dizer? Gananciosos é a palavra, né?
Acho que nunca pode se dizer que é amigo de um goblin, digamos que a relação é mais nesse sentido: enquanto você for útil, ele irá te recompensar. São bons em fazer negócios, mas você que não tente passar a perna em nenhum deles ou a coisa vai ficar feia para o seu lado. É... melhor parar por aqui.
O lado bom da Vila Catraca é que você pode encontrar de tudo, encontrei até alguns humanos. De cara eu não soube como reagir, Fuuli deixou bem claro que agora somos inimigos porque eu sirvo à horda, mas lá eles pareciam fazer negócios, bem... não sei dizer, e quando se trata de esquemas com goblins, aprendi que saber o menos possível pode ser sua salvação. (Eu tô rindo enquanto escrevo isso, mas é de nervoso)
A verdade é que senti certo alívio em deixar a Vila Catraca e aquela sensação constante de manter "um olho no peixe e outro no gato". Acho que é até mais seguro dormir na estrada do que na estalagem de lá, mas nenhum dos dois foi necessário. Eu ganhei, como forma de pagamento, uma viagem de barco rio acima até o próximo posto da horda. Lá passei a noite e descansei.
No dia seguinte voltei a marchar novamente para oeste. Haviam me informado que Darsok, um outro orc que também vigiava um posto, estava precisando de ajuda em seu pequeno forte, localizado na ponta norte da fenda que Asa da Morte causou dividindo os Sertões em dois anos atrás.
A viagem estava tranquila, o céu bem azul e tudo parecia ir bem até que Wohali soltou seu tão característico aviso. Entrei em alerta e me pus a olhar para a direção que ele estava e meu eu coração se apertou. Um jovem kodo estava encurralado por três leoas da savana enquanto defendia o corpo imóvel do que julguei ser sua mãe.
Saquei meu arco e puxei a rédea do meu alce para a direção daqueles animais. Quando uma das leoas decidiu que era hora de dar o bote e saltou para cima do jovem kodo, minha flecha já estava preparada. Atirei sem hesitar e ela atingiu o alvo atravessando o seu pescoço momentos antes da leoa alcançar a presa.
Só então as demais leoas perceberam a minha presença e eu já estava com mais uma flecha pronta para atirar caso fosse necessário, mas rezava à Mãe Terra para que desistissem e fossem embora. Eu sei que é a lei da natureza, sei que elas precisam se alimentar, mas o pobre kodo já havia perdido a mãe, ele merecia uma chance.
Como que atendendo a minha prece, as duas leoas começaram a correr assim que desci da minha montaria com um pulo e fazendo um estrondo no chão. O jovem kodo estava igualmente assustado e acredito que sua mente só dizia que havia trocado um predador pelo outro, mas assim como os demais caçadores, tenho um certo jeito com animais.
Me aproximei com calma e fiz carinho em sua cabeça. Pedi a Wohali que se certificasse de que as leoas tivessem ido embora e quando me virei para voltar ao meu alce ouvi um barulho estranho, mas tinha uma sonoridade muito triste, era como se o animal estivesse chorando. Meu coração se partiu, e naquele momento eu soube que não poderia deixá-lo.
E foi assim que minha terceira fera foi domada. O jovem kodo continuava com um semblante triste, mas ao mesmo tempo aliviado por não estar mais sozinho. "Não se preocupe meu amigo, vamos cuidar de você, estamos juntos agora." eu lhe disse enquanto Wohali guinchava em concordância. E nós três demos continuidade ao destino a oeste.

Comments